III

era uma vez...

Apenas um sentimento nômade.

As pessoas, às vezes, se sentem tomadas por uma sensação estranha, sem muitas explicações elas se retraem, se calam, mas se recusam a ficar sozinhas, isoladas do mundo. Então procuram lugares onde haja um movimento de outras pessoas, um resquício de conversa perdida no ar ou alguns olhares sem direção, qualquer fato que possa distrair e salvar o dia.

Tudo o que se quer é olhar para fora, ver como as pessoas se comportam diante das suas próprias limitações de corpo, mente e alma.

Junho chegara ao fim sem muitos planos para ela. Era seu primeiro dia de férias.

Por mais ordinário que um dia pareça ser ele nunca será um dia qualquer. Embora ciente de que a cada segundo as ações e os pensamentos se transformam e reorganizam o mundo ao redor, ela estava dispersa de qualquer explicação fundamentada.

Tinha um desejo profundamente simples de distrair-se da falta e do excesso de tudo o que a perturbava e carecia de explicações. Não havia nada a perder e ela sequer acreditava que pudesse ganhar alguma coisa, então brincava com a segunda-feira do mesmo jeito inocente e desligado que brincava com a sorte.

Dentro da sala de paredes alaranjadas ela disfarçava lendo as mesmas notícias repetidas do mundo. Na lista de espera era a última, em frente à letra X se lia seu nome.

São poucos os que se atrevem a ler o que se esconde em rodapés de página, mas todos que se arriscam sabem que ali sempre se guardam surpresas escondidas. São como olhos indecisos de gente miúda.

Ela nem percebeu o instante em que ele entrou. O - não - encontro.

Dizem que quando as buscas cessam o invisível milagrosamente salta aos olhos. Ele se lembraria da primeira vez que a olhou? Ele se lembraria de quantas primeiras vezes ele a olhou? Algumas respostas só se imaginam enquanto que outras já sabemos irrespondíveis.

Ela queria muito saber o que ele pensava porque o que ele disse jamais vai ser esquecido: oi.

Um oi escondido no meio de um sorriso acanhado, porém, um oi confesso. Ele confessava em silêncio que pensava ser ela a sua última tentativa e se arriscou cheio de poucas tantas esperanças.

Confessar as coisas nem sempre é tarefa fácil, deixa-te de peito aberto, mostra a cara de todos os seus sentimentos. É uma coragem que te diminui e te faz crescer sem limites porque isso é dividir com o outro a responsabilidade de dizer o que se diz sem receio algum.

Nos segundos seguintes, ela buscou um restinho de si e, com cara de pouca conversa, respondeu seu oi seco e atravessado. Era a sua maneira de se proteger, não estava interessada em repetir erros. Respirou fundo e disse a si mesma, cheia de convicção, que em pouco tempo ele iria embora e a história terminaria aqui.

Instigado e contrariando tudo o que ela esperava, ele riu e achou a maior graça em perturbá-la.

Sentiram-se, olharam-se e descobriram-se ali; longe de tantos sonhos e realidades. Seus caminhos cruzaram-se por alguma razão desconhecida e naquele instante, o mundo de cada um entrelaçava-se e as histórias que sabiam dos livros e da vida começavam a fazer outro sentido, seguiam na mesma direção e tinham a mesma cor.

Indescritível.

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